Bromélias semeadas, bromélias preservadas

Por: Rose Aielo Blanco


Alcantharea imperialis num projeto paisagístico

Elas fazem parte de uma família que conta com nada menos que 56 gêneros e cerca de 3 mil espécies. Elevadas à categoria de ornamentais recentemente, várias espécies de bromélias estão sofrendo de um mal perigoso: a ameaça de extinção.
Vítimas das devastações de seus habitats naturais, perseguidas por serem acusadas de facilitar a proliferação de insetos responsáveis pela transmissão de doenças como a malária e o dengue, as bromélias agora "colhem o amargo fruto da fama" - como plantas ornamentais alcançam bom preço no mercado e, por isso, são colhidas predatoriamente. O pior disso tudo é que além de contribuir para a extinção de várias espécies, a coleta predatória coloca no mercado bromélias em péssimo estado. Segundo a Sociedade Brasileira de Bromélias, os exemplares colhidos nas matas dificilmente têm uma aparência perfeita e trazem sempre as cicatrizes de sua interação com o meio, diferente do que ocorre com as bromélias cultivadas em viveiros.
A inclusão de bromélias não só nos jardins como também em ambientes internos tem sido surpreendente. Isso significa que a procura por espécies é cada vez maior, estimulando a coleta predatória. A justificativa é uma só: a produção de bromélias para comercialização é lenta e difícil, ou seja, não compensa. O argumento, felizmente, parece que começa a desmoronar. Iniciativas no sentido de provar que a produção é viável começam a mostrar bons resultados. Um bom exemplo é o trabalho realizado pelo produtor Rogélio Dosouto, proprietário do Viveiro Adônis, no Parque Cerros Verdes, na região da Serra da Cantareira, em São Paulo (SP). Além de produzir diversos tipos de plantas ornamentais e árvores nativas para reflorestamento, Rogélio sempre se interessou pelas bromélias. Em 1994, começou a desenvolver técnicas para a multiplicação de bromélias usando sementes e suas experiências logo revelaram que o método se mostrava lento para produção de algumas espécies de sombra e plenamente viável às espécies de sol pleno. A constatação levou-o a escolher a espécie Alcantarea imperialis (classificada anteriormente como Vriesea imperialis) para desenvolver seu trabalho.
Em dezembro de 1995, Rogélio Dosouto iniciou sua produção de Alcantarea imperialis usando as sementes como método de propagação. Hoje ele conta com 50 mil mudas desta espécie já selecionadas em seu viveiro e está conduzindo experiências de semeadura com cerca de 20 espécies de diversos gêneros de bromélias. Segundo ele, "o resultado prova que é totalmente viável produzir este tipo de planta em viveiros, o que não justifica a coleta predatória e destrutiva. Além disso, para os paisagistas e consumidores, a vantagem é que as bromélias produzidas em viveiros apresentam-se em excelente estado, sem folhas marcadas ou danificadas, comuns nos exemplares extraídos das matas. Isso sem falar no aspecto ecológico, pois as bromélias na natureza exercem importante papel no equilíbrio ecológico, servindo de alimento, moradia e refúgio para inúmeros seres vivos - desde protozoários até mamíferos.

A. imperialis

Ao lado, Rogélio Dosouto com uma de suas matrizes

Indicada para o cultivo sob sol pleno, a Alcantarea imperialis confere um toque exótico a vários tipos de composições, especialmente em jardins de pedras. Trata-se de uma bromélia rupestre (também conhecida como saxícola), isto é, fixa-se em pedras ou rochedos.

Na natureza, esta espécie é capaz de se fixar num paredão de pedra a 90 graus. Visitando um dos locais onde esta espécie ocorre em maior abundância, na Serra dos Órgãos, em Teresópolis (RJ), Rogélio conta que a visão é surpreendente: "na imensidão daquelas pedras, essas bromélias parecem inúmeras antenas parabólicas apontando para o ponto mais alto do céu". A imperialis produz um pendão floral que alcança cerca de 3,5 m. de altura e o processo de abertura das flores ocorre em seqüência: de baixo para cima e de dentro para fora, formando um ciclo de floração que se completa num período do 5 meses. As flores se abrem ao anoitecer e são muito procuradas por abelhas e beija-flores.
Na sua produção, Rogélio faz a semeadura das bromélias a lanço em canteiro, usando areia e turfa. Ali, as sementes demoram de 20 a 30 dias para iniciar a germinação. As pequenas mudas ficam no canteiro por um período de 6 meses mais ou menos e depois são repicadas para as bandejas, onde permanecem em local protegido, sob o controle ideal de luminosidade e umidade, por mais 6 meses. Quando atingem cerca de 6 a 7 cm. de altura, as mudas são transferidas para pequenos vasos plásticos contendo um substrato específico, que inclui turfa e terra vegetal, ou podem ser levadas para canteiros e plantadas no espaçamento de 20 x 20 cm. Num canteiro com cerca de 40 m2 é possível plantar 1.000 mudas de brómélias. Nos vasos ou canteiros a planta já começa a produzir brotações laterais - seus "clones naturais", explica o produtor, que também podem ser plantados, gerando novas bromélias. É nesta fase, ainda, que a muda vai se desenvolver até atingir o tamanho ideal para ser levada ao campo. No período de 2 anos ela alcança 50 cm. de diâmetro. Muito tempo? Não, garante o produtor, "dependendo da espécie, uma palmeira pode levar de 5 a 10 anos para ser aproveitada numa composição, esta bromélia em 4 anos chega na sua plena forma para uso paisagístico".
Para garantir a boa procedência das sementes, ele mantém em seu viveiro alguns exemplares-matrizes de Alcantarea imperialis, um deles chega a atingir cerca de 2 metros de diâmetro.
A experiência com a imperialis mostrou resultados tão positivos que Rogélio Dosouto arriscou novas tentativas, como os trabalhos de hibridações que está conduzindo, usando a A. imperialis, a Vriesia incurvata (conhecida popularmente como "linguinha") e a Vriesia fosteriana.
Até o momento, a dedicação às bromélias tem dado um certo trabalho e tirado muitas horas de sono do produtor, que é ajudado no viveiro pela mãe, D. Olga. Quando perguntei a ele se a semeadura desta bromélia vale a pena, a resposta foi segura: "vale, porque o seu crescimento é rápido, podemos obter plantas perfeitas e além de tudo é uma medida ecológica".

Bromélias: verdades, preconceitos e curiosidades

As bromélias são parasitas.
Puro preconceito.
As bromélias que se apoiam nos troncos ou galhos de árvores são chamadas "epífitas", pois não retiram nutrientes dos outros vegetais, apenas usam-nos como suporte. O mesmo preconceito perseguiu as orquídeas (outro exemplo de epífitas) por longo tempo até que se provou o contrário. Existem também as bromélias "rupestres" (que se fixam sobre pedras, como a Alcantarea imperialis e a Alcantarea edmundoi , entre outras) e as "terrestres" (que se fixam sobre o solo). Algumas espécies são capazes de viver penduradas em árvores e até nos fios da rede elétrica; outras são tão versáteis que podem sobreviver tanto no chão da floresta como na copa das árvores (como a Vriesia hieroglyphica).

Se plantarmos bromélias no jardim de uma casa vamos atrair cobras, sapos e pernilongos.
Não é bem assim.
O embricamento formado entre as folhas de alguns tipos de bromélias cria uma espécie de "copo" que serve como depósito de água. Na natureza, esta água parada realmente atrai insetos que, por sua vez, atraem sapos e, seguindo a ordem natural das coisas, acabam atraindo cobras. Só que isso só pode ocorrer nas matas ou num jardim completamente abandonado. Esta capacidade de manter a natureza em equilíbrio é que confere às bromélias tamanha importância ecológica. Para que cobras, sapos e outros bichos se sintam à vontade num jardim residencial é preciso reproduzir boa parte do ambiente natural de uma mata. Além disso, num jardim bem cuidado, não é difícil manter os "copos" livres da água parada.

Algumas bromélias são comestíveis.
Verdade.
O membro mais ilustre da famílias das bromélias é realmente comestível, trata-se do famoso "abacaxi" (Ananas comosus), que foi levado para a Europa há mais de 300 anos e tornou-se um verdadeiro sucesso. Outra bromélia também famosa, conhecida popularmente como "gravatá", é a Bromelia antiacantha, usada como planta medicinal para tratar tosse e bronquite.

A coleta de bromélias nas matas pode levá-las à extinção.
Infelizmente isso já está acontecendo
. A Vriesia hieroglyphica, por exemplo, vem sendo extraída da Mata Atlântica para ser vendida como planta ornamental. Mesmo quando não está florida, ela é de notável beleza, por seu porte majestoso e suas folhas com desenhos que parecem hieroglifos. Em razão da atividade extrativista, esta espécie encontra-se ameaçada de extinção.

Algumas bromélias podem viver até sem as raízes.
Verdade.
As bromélias são realmente muito eficientes no aproveitamento de água e nutrientes. A Alcantarea imperialis é um bom exemplo de eficiência. Rupestre, ela se fixa nas pedras e rochas, enquanto o vento se encarrega de transportar e despejar nutrientes dentro do seu "copo" ou tanque. Estruturas presentes nas folhas - os tricomas foliares - são especializadas em absorver a água (da chuva) e os nutrientes, garantindo a sobrevivência da planta. Assim, mesmo com as raízes cortadas, esta bromélia é capaz de continuar viva e logo produz novas raízes para sua fixação e sustentação.