Planta ajuda a monitorar poluição
Tradescantia
pallida cv. purpurea
Em
dias mais poluídos, uma pessoa tem 33% a mais de chance de sofrer
um infarto. Levantamento feito na cidade de São Paulo revela que
pelo menos 12% das mortes envolvendo idosos acontecem em decorrência
dos altos níveis de poluentes emitidos principalmente pelos veículos
existentes na cidade.
Além de causar doenças cardiovasculares (infarto e arritmia)
e respiratórias (asma e pneumonia), a poluição ainda
é vista como um verdadeiro veneno para gestantes e bebês.
Já está comprovado que altos níveis de poluentes
podem contribuir para a prematuridade da criança e seu baixo peso
ao nascer.
E
o que isso tem a ver com a planta popularmente conhecida como "coração-roxo"?
É que o Laboratório de Poluição Atmosférica
Experimental da Universidade de São Paulo (LPAE/USP) realizou um
estudo que comprova que a planta Tradescantia pallida, a popular
coração-roxo, ajuda no controle da qualidade do ar - é
o biomonitoramento.
Na cidade de Santo André (SP), a planta está ajudando o
Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André)
a monitorar a qualidade do ar da cidade, servindo como um sensor na análise
de dados. O objetivo é fazer um mapeamento completo dos bairros
mais poluídos. Em 2002, floreiras foram plantadas em seis pontos
da cidade.
Em um estudo preliminar, analisando-se mutações da planta
entre setembro de 2003 e janeiro de 2004, constatou-se as áreas
mais poluídas de Santo André.
A idéia do biomonitoramento foi do professor Paulo Saldiva, da
Faculdade de Medicina da USP, parceira no estudo. Em 2002, Saldiva participou
em Santo André de um seminário sobre meio ambiente e propôs
para a Prefeitura o biomonitoramento, por ser uma tecnologia mais barata
e tão precisa quanto os métodos convencionais. "Santo
André é uma cidade com vocação industrial
e com número elevado de carros. Daí a preocupação
com o monitoramento do nível de poluição", diz
Saldiva, supervisor do programa.
Em 1998, o professor descobriu as propriedades do coração
roxo na Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, por meio de um pesquisador
chinês. "Essa planta é fácil de cultivar em qualquer
lugar e tem alta resistência. O seu DNA (ácido desoxirribonucleico)
registra os poluentes e suas mudanças", conta Saldiva.
Entre 2002 e 2003, foram preparadas as condições para a
coleta das plantas. "Esse tempo foi necessário para que criássemos
condições iguais de cultivo nos seis pontos da cidade, para
que não houvesse divergência de dados", explica a bióloga
Eriane.
Entre setembro de 2003 e setembro deste ano, foram recolhidas amostras
quinzenalmente nas floreiras e encaminhadas para a USP e para o Ipen (Instituto
de Pesquisas Energéticas e Nucleares), que é responsável
em detectar todos os elementos poluentes encontrados.
O projeto também tem o objetivo de realizar educação
ambiental. Estudantes de escolas municipais e estaduais são convidados
a conhecer o programa e entender as propostas do biomonitoramento. "Tentamos
conscientizar os jovens sobre a necessidade de preservação
ambiental", conta Eriane.
E
em Salvador, na Bahia, a plantinha também está mostrando
serviço...
Ainda
que Salvador não possua grandes complexos industriais dentro da
área urbana, sua população está vulnerável
a ação de diversos poluentes que são liberados principalmente
a partir da queima de combustíveis durante o funcionamento de veículos
automotores. A depender da concentração, esses poluentes
podem causar até câncer. Esta afirmação é
da bióloga Josanidia Santana Lima, que coordena uma pesquisa sobre
a utilização da Tradescantia pallida cv. purpurea
(normalmente encontrada em canteiros públicos da cidade) na avaliação
da poluição atmosférica de Salvador.
A pesquisa com a Tradescantia pallida, segundo a bióloga,
é apenas uma das várias na área de biomonitoramento
atmosférico por meio de vegetais realizado pelo Laboratório
de Avaliação de Impactos em Ecossistemas Terrestres (Laviet)
do Instituto de Biologia (Ibio) da Universidade Federal da Bahia (Ufba),
do qual é coordenadora. "Esse biomonitoramento pode ser ativo
ou passivo. No primeiro caso, monitora-se a vegetação já
presente no ambiente que se está avaliando. No segundo, introduz-se
nas áreas a serem avaliadas vegetais cultivados em condições
padrões", explica.
O biomonitoramento usando a Tradescantia pallida é ativo,
uma vez que a planta já existia nos ambientes avaliados. Em termos
práticos, ele se traduz na utilização do que Josanidia
Lima chama de "teste Trad-MCN", que se baseia na contagem de
micronúcleos em células mães de grãos de pólen
na Tradescantia. "O uso deste teste permite determinar a capacidade
de substâncias causarem danos ao material genético, levando
à formação de micronúcleos ao fim da divisão
celular. Uma freqüência elevada de micronúcleos nas
análises é o indicador de que as substâncias afetam
a planta", explica a bióloga.
A estrutura do DNA e seus mecanismos de replicação e reparo
são universais para todos os seres vivos, ou seja, o que causa
danos ao material genético dos vegetais pode vir a causar danos
aos cromossomos de seres humanos.
O teste Trad-MCN revelou que, nos locais testados com um maior tráfego
de automóveis, onde a emissão de poluentes é maior,
há uma concentração de "compostos clastogênicos",
pois as células da planta recolhida nesses lugares apresentaram
mutação genética (alta freqüência de micronúcleos).
"Já nas células da planta recolhida em áreas
de menor fluxo de veículos, as freqüências médias
de micronúcleos encontradas foram menores", compara.
De acordo com Jasanidia Lima, a freqüência de micronúcleos
esperada para locais isentos ou com nível baixo de poluição
é de 8%, enquanto que em locais extremamente poluídos, como
garagens de grandes edifícios, são esperadas freqüências
que atinjam até 28%. Estudos remontam a 1789O uso de vegetais como
bioindicadores data de 1789, segundo a bióloga Josanidia Lima.
"Quatro químicos holandeses observaram que plantas de hortelã
e feijão, em uma redoma, ficaram manchadas depois de expostas,
por um dia, a vapores de mercúrio e morreram dias depois",
conta. O teste Trad-MCN, por sua vez, foi desenvolvido em 1978. Desde
então, ele tem sido utilizado para monitorar a ação
de poluentes do ar em vários locais dos Estados Unidos, Canadá,
Alemanha, República Popular da China e México. O teste foi
introduzido no Brasil recentemente e já foi utilizado com sucesso
por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (USP) e do Instituto de Botânica de São Paulo.
A espécie Tradescantia pallida cv. purpurea é uma
planta ornamental facilmente encontrada em ruas e jardins, mesmo em locais
com concentrações elevadas de poluentes atmosféricos.
Por essas características, ela é adequada para o biomonitoramento.
Uma das principais vantagens do teste Trad-MCN, segundo Jasanidia Lima,
é que ele é rápido, altamente sensível, eficiente
e econômico, fornecendo uma advertência precoce sobre a qualidade
do ar. "É bastante adequado para ser implementado em países
em desenvolvimento para fins de proteção ambiental e da
saúde da população", conclui.
Fontes:
Correio da Bahia e Diário do Grande ABC
Para
ler a respeito da pesquisa realizada com a planta pelo Laboratório
de Poluição Atmosférica Experimental da Universidade
de São Paulo:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/entrez/query.fcgi?cmd=Retrieve&db=PubMed&list_uids=12774990&dopt=Abstract
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